A mídia e suas estratégias

É impressionante como a grande mídia no Brasil, que pertence a poucas e milionárias famílias da elite mais aristocrática e poderosa, age de concerto, com estratégias cuidadosamente combinadas.

Não precisa ir muito longe na análise para perceber, mas me pergunto por que tanta gente bem informada se deixa enganar. Há um hábito preguiçoso de acreditar na mídia por acreditar, sem se dar ao trabalho de duvidar, fingindo que mídia neutra e informativa é algo mais do que esperado e normal. Não é.

Tomemos só dois exemplos, e não mais do que isso, pra perceber qual a estratégia do momento. A IstoÉ, que pertence à Globo, faz uma capa com o rosto de Lula e do fascista, com a pergunta: "quem é o mais odiado"?

Hoje, o insuspeito Giannetti da Fonseca (é uma ironia, ele coordenou campanha de outro extremista da direita, o Dória) escreve na Folha artigo com o mesmo raciocínio, que vem sendo construído nos últimos dias pelo grande guru do mal, o Merval Pereira, da Globo: o de que estamos frente a uma polarização entre dois extremistas radicais, o fascista e Haddad, e que isso estaria colocando em risco a "democracia".

Engraçado, logo eles que, por não aceitar uma vitória nas urnas deram um golpe e, por não ter nenhuma alternativa, abriram as portas para a consolidação de uma extrema direita fascista da pior espécie. Agora vêm dar lição sobre democracia. Se fosse qualquer lugar com um mínimo de independência da imprensa, soaria tão ridículo que ninguém levaria à sério. Mas, no Brasil, onde se acredita em qualquer imbecilidade desde que seja proferida por um Bonner, acaba sendo ouvido.

Há um pequeno detalhe que já desmonta a farsa. Dentre os dois "odiados", há um que, apesar de perseguido e preso, levaria a eleição no primeiro turno. Só isso. Enquanto o outro, em poucos dias, conseguiu arregimentar mais de dois milhões de mulheres conta ele. É impressionante como na cabeça de Mervais e Cia. a ideia de democracia é tênue. O fato de um sujeito ter dezenas de milhões de pessoas que clamam por ele é simplesmente ignorado, pois "vontade do povo" é um conceito que só vale na Globo pra eleger piloto brasileiro de F1 como o melhor da história. Pelo contrário, podem ser milhões, quantos forem, os caras terão a cara de pau de dizer que ele é odiado. Aliás, o que pesou na manifestação da ONU em defesa da candidatura do Lula foi justamente esse argumento: como uma democracia pode deixar que seja calada a voz maciça e majoritária do povo, pelas mãos de uns poucos justiceiros togados que montam uma peça de perseguição duvidosa, enquanto fazem vista grossa para políticos historicamente salafrários?

O desespero desse pessoal é que de tanto fingir que a democracia não existe, acabaram sendo comidos por ela. "O povo não é bobo, fora a Rede Globo" nunca foi tão verdadeiro. Passados dois anos do golpe, a grande farsa não cola mais. E quanto mais agem contra a democracia, mais parece ter força a reação da maioria. Desesperados e sem alternativa, deixaram passar entre os dedos o monstro que usaram para desestabilizar o governo e o PT. Agora já não o controlam, e estão com medo de também perder o poder, mas desta vez para algo cujas consequências até eles desconhecem.

Diante disso, só há duas opções: a pior, embarcar de vez no bonde fascista, e há muitos neotucanos que já fizeram claramente essa opção (e não tenho dúvidas que já já Merval, Sardemberg e Cia estarão fazendo também). Aos tucanos mais tradicionais, que ainda têm um microgramas de responsabilidade política e de respeito ao seu país, resta tentar viabilizar uma terceira via - e parece só lhes restar o Ciro - que lhes permita evitar o vexame de perder novamente para o PT.

Daí a estratégia de dizer que o fascista e Haddad são ambos extremistas, mas de Campos opostos.

Ora, será que pega? Equiparar os milhões que estão apoiando cada vez mais a volta da era Lula - marcada pelo crescimento e o diálogo -, a volta de gente que já provou que governa para o povo e não para as elites, com um bando de extremistas ignorantes, toscos, que pedem a volta dos milicos e externam misoginia, preconceito, racismo e picaretagem a cada palavra que proferem?

Pega ainda menos pelo fato que, se for pelo simples comportamento pessoal, o Ciro é bem mais esquentadinho (e não vejo mal nisso) que o Haddad tranquilão. Qualquer um que tenha acompanhado minimamente a gestão Haddad sabe que ele se destacou pelo diálogo, a atenção a todos os setores da sociedade, o resgate dos valores de civilidade e democracia de que tanto precisamos e, evidentemente, a opção em dar prioridade ao fim da desigualdade. Haddad foi o primeiro prefeito a conseguir renegociar as dividas e equilibrar as contas municipais. Onde está o radicalismo? Aliás, será que o povão, que eles tanto ignoram, vai esquecer que os governos Lula e Dilma tiveram poucos arroubos radicais, e de demarcaram sobretudo por definir o fim da miséria no país como sua principal prioridade?

O âmago do engano dessa nova estratégia do gênio Merval e seus comparsas está em querer fazer confundir opções de governo que olham para o social, pregam o fim da pobreza, dos privilégios, defendem a democracia e, sim, enfrentam a corrupção, com radicalismo de esquerda.

Não cola. Mas o desespero é grande. Será que o medo de perder sua onipotência os levará a sacrificar o país tentando jogá-lo no obscurantismo? Não duvido mais nada desses senhores.

Mas eles não perceberam que a "o povo não é bobo". Fora a Rede Globo.